Gabriel Mario Rodrigues
Presidente do Conselho de Administração da ABMES
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“Não se preocupe com as pedras no caminho sejam elas grandes ou pequenas. As grandes a gente pula e as pequenas a gente chuta.”
Edgar Morin, sociólogo e antropólogo, participou do 3º Congresso Sociomoemocional Liv – Laboratório de Inteligência de Viva, realizado no Rio de Janeiro nos dias 7 e 8 de junho. Com mais de 30 livros publicados é, sem dúvida, não só um cientista da educação, como um defensor do ensino como uma forma de enfrentar as incertezas em tempos de crise.
Perto de fazer 98 anos de idade, ele foi categórico em entrevista ao jornal O Globo ('Resistir às incertezas é parte da Educação', diz Edgar Morin). Com bastante lucidez, é taxativo em declarar que “na Educação, em tempos ditos normais, ensinam-se certezas, e não incertezas”. E em tempos conflituosos como o que vivemos, as crianças precisam estar preparadas a conviver com as dificuldades e com os desafios.
O erro faz parte do aprendizado, completamos nós, e os jovens precisam estar preparados para conviverem com um mundo difícil e com os desafios de um futuro transformador que os espera.
É por esta razão que nos últimos artigos estamos observando que todas as instituições educacionais devem se preparar para as mudanças exponenciais que os ambientes sociais, econômicos e políticos estão criando devido ao contexto de tecnologia, comunicação e informação. É fundamental fortalecer a implantação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), desde o infantil ao ensino médio, com objetivo de formar pessoas aptas a enfrentar o desafio das ocupações do futuro.
Já escrevemos que as escolas particulares sentem o problema e, para oferecer o melhor curso a seus estudantes, empenham-se cada uma a ter um programa curricular que atenda esta transformação digital e competências socioemocionais que a realidade impõe. Mudar um currículo educacional já é difícil. Imagine implantar uma nova etapa, onde o aluno é protagonista e não mero assistente desinteressado. É desafio incomensurável.
Os dados do relatório “Competências e Empregos: Uma Agenda para a Juventude”, divulgado pelo Banco Mundial no ano passado, são terríveis para o Brasil. O relatório aponta que metade dos jovens brasileiros estão ameaçados pelo desemprego e pela pobreza.
- 11,2 milhões pertencem aos “nem-nem” – não estudam e não trabalham
- 2,2 milhões só estudam, com defasagem;
- 8,8 milhões só trabalham, na informalidade;
- 2, 8 milhões trabalham na informalidade e estudam.
Estes dados são alarmantes e refletem o país desigual que temos e que só pode ser resgatado se tivermos motivação e propósito de mudar, o que, em suma, começa pela Educação. É desafio da sociedade e do Estado, principalmente para criar um país mais desenvolvido e com oportunidades para todos.
E por perceber que o governo está muito pouco sensível a isto é que apresento uma oportuna colaboração recebida do Professor Raulino Tramontim que mostra “o caminho das pedras”:
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Esse tema provoca uma reflexão muito interessante para discutir o papel dos diferentes atores que deve atuar na implantação das BNCC;
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Observe primeiro qual o papel do Governo Federal. Primeiro, o CNE aprovou a proposta que foi homologada pelo ministro e inclusive traçou os diferentes (vamos chamar de) módulos;
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Mas temos a LDB que diz que o ensino básico e de competência de estados e municípios e aí começa o problema. Os estados brasileiros são extremamente heterogêneos em seus sistemas educacionais, desde os mais pobres aos mais ricos;
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E aí como fica?
a) Precisamos fazer a modelagem de implantação das diretrizes para adaptação a cada sistema observando as regras básicas na área pública, pois a área particular, como você bem disse, sabe se organizar e planejar melhor; -
Observe que o MEC está parado e não consegue montar um plano de ação que compreenda:
a) Reunião com os secretários de educação de cada Estado para que apresentem os números de seus sistemas o mais detalhado possível para saber com o que vamos lidar. Por exemplo: quantos professores precisam de atualização? Sem contar o problema da infraestrutura que exigira um investimento pesado que na atual conjuntura e inviável... não há grana nem para as despesas obrigatórias, quanto mais para investimentos necessários sem o que não dá para implantar as diretrizes;
b) Organizar uma pauta de treinamento técnico sob responsabilidade da SEB que faça reuniões em cada estado para viabilizar grupos de disseminadores para os municípios;
c) Ao MEC cabe analisar quanto cada Estado vai precisar para investimentos e os Estados devem apresentar quando cada município vai precisar também para investimentos;
d) Treinar a modelagem na pratica, pois tudo mudou e não e fácil... eu sei por que fui professor alfabetizador e lecionei em escola multiseriada, nos ginásios orientados para o trabalho e também no técnico-científico;
e) Deve ser implantado para iniciantes e não para quem já está no sistema, pois a adaptação criaria problemas mais sérios do que se imagina. Adaptação e sempre problemática.
f) Acompanhamento pela SEB-Secretaria do Ensino Básico, monitorando em tempo real cada estado e para tanto o governo deve obrigar os estados a implantar a internet em cada escola e os municípios também. Temos satélite disponível e a há um programa onde o governo federal doa a antena e a instala cabendo ao governo local providenciar o terreno e a manutenção do equipamento. Até gora não passa de 230 municípios que aderiram, sinal que ou não entenderam a importância da internet ou é omissão mesmo.
g) Para que tudo isso funciona, o MEC deve celebrar um pacto federativo (não gosto do termo pacto, mas não encontro um melhor. Talvez termo de compromisso ou responsabilidade) com cronogramas bem definidos, tarefas indicando os responsáveis e o mais importante acompanhamento e avaliação seria onde quem não cumprir o dever de cada deve sofrer algum tipo de penalidade .O MEC não pode ficar no papel de enviar dinheiro do Fundeb e do salário educação sem controle efetivo... ninguém sabe a verdade dos números. -
A palavra desafio é apropriada, pois para assumir qualquer desafio tem que haver vontade política e me parece que aí começam os problemas. Hoje não há vontade política para isso.... estão preocupados com ideologia para dizer pouco... tanto que vai aconteceu na USP o encontro dos ex-ministros da educação para fazer um documento e encaminhar ao MEC. (Ex-ministros criam Observatório em defesa da educação)
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A geração atual tem pressa e nossos dirigentes não! A educação tem pressa, pois estamos atrasados para não dizer perdendo tempo precioso... Já perdemos muito, enquanto outros países a iniciativa privada dá passos importantes no setor colocando-se na vanguarda da boa gestão tanto pedagógica como administrativa;
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Também precisamos cutucar o CNE para que comece a revisar as licenciaturas que formam os professores para que suas propostas tenham afinidade com as novas BNCC. Talvez ao invés de licenciaturas deveríamos ter um Programa de Formação de Professores para o ensino básico, formado por diversos módulos que certificassem os professores que ao longo do tempo poderiam ir subindo fazendo novos módulos.... Precisamos pensar diferente... ainda não sei como, o que sei que nossas licenciaturas não servem mais. E o mais problemático elas não são avaliadas e nesse cenário o ensino particular forma mais de 69% dos licenciados em pequenas faculdades principalmente. Mas pior ainda, quem vai fazer licenciatura e o pobre que não consegue algo melhor......
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Daí precisamos pensar como fez a Coreia do Sul e criar um Instituto de Formação de Professores em cada região;
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Creio que devemos colocar na pauta das prioridades em tudo a questão da implantação das Diretrizes tanto no ensino básico, quanto no ensino médio se não quisermos morrer na praia, pois a cada dia recebemos alunos pior preparados nos processos de entrada nas escolas superiores e aí ter um diploma universitário não e sinal de saber, precisa apenas pagar a mensalidade e deixar o tempo passar para receber um inútil diploma.
Como primeiro passo, a iniciativa particular que tem acesso à maioria dos municípios brasileiros podia promover programas de instalação de antenas nas escolas municipais, que ainda não têm acesso à internet. E depois orientar como os professores podem usar a rede em benefício do aprendizado. Enfim, ensinar a encontrar o caminho das pedras. Esta é apenas uma sugestão, mas muito mais pode e deve ser feito. Precisamos começar a chutar as pedras pequenas que estão no caminho do desenvolvimento.